Faltando uma semana para a “virada de chave”, estamos prontos para a Nova Lei de Licitações?

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Chegamos ao quinto episódio de nossa série sobre a Nova Lei de Licitações (“NLL”), em que analisamos se a Administração Pública está pronta para implementar a NLL.

Ainda que a NLL não represente uma ruptura com a Lei n° 8.666/93, é indiscutível que ela trouxe importantes novidades. Destacamos o Portal Nacional de Compras Públicas, novas formas de contratação (como o diálogo competitivo), e o posicionamento da lei como vetor de políticas públicas (temas que tratamos aqui e aqui).

A mudança possivelmente mais profunda que a NLL traz diz respeito à organização interna da Administração Pública. Deixando de lado a discussão sobre a constitucionalidade de uma lei federal definir em detalhes como os órgãos de todos os entes federativos devem ser estruturar, fato é que a NLL busca promover uma verdadeira reforma da Administração Pública. Por exemplo, determina que os órgãos públicos implementem gestão por competências (art. 7°), governança pública (art. 11, parágrafo único) e segregação de funções (art. 7°, § 1°) nos processos relacionados a licitações e contratações (para mais exemplos, sugerimos este artigo publicado por Marçal Justen Filho).

Diferentemente da Lei n° 8.666, que entrou em vigor em 1993, quando a informática e a internet eram incipientes, a NLL tem a virtude de trazer os processos licitatórios ao ambiente digital, privilegiando a agilidade e transparência das compras públicas. Por outro lado, tais inovações exigem que a Administração Pública – em todos os seus níveis – crie novos sistemas.

Ou seja, para implementar a NLL, os órgãos públicos dos diferentes entes federativos terão que se reestruturar. Será que estão prontos?

A resposta, especialmente considerando municípios menores, é preocupante.

De acordo com Paulo Ziulkoski, presidente da Confederação Nacional dos Municípios, em entrevista ao Valor Econômico (acessível aquiFizemos pesquisa com mil municípios e 60% deles não estão preparados ainda para as novas regras. Houve muitas palestras sobre a lei, mas poucas oficinas de como aplicar isso nos municípios e como construir as ferramentas digitais.”

Esse não é o único foco de atenção, infelizmente.

Para além da reforma organizacional dos órgãos públicos e do desenvolvimento de sistemas de informática, a NLL exige a elaboração e publicação de diversos regramentos. Isso, porque muitos artigos da NLL carecem de regulamentação.

O Governo Federal tem atualizado o estágio de regulamentação da NLL. De acordo com a versão divulgada em 17.03.2023 (acessível aqui), a NLL exige 73 regulamentações, das quais 37 foram publicadas, 14 estão em fase de elaboração, e 22 sequer foram iniciadas. Portanto, há muitos temas pendentes de regulamentação, como o registro cadastral unificado, e os critérios para declaração de inidoneidade para licitar ou contratar.

Ciente de que a NLL exigiria importantes reestruturações, o legislador concedeu dois anos para que os diferentes entes públicos e empresas pudessem se adaptar à nova realidade (tema que tratamos aqui). Na nossa avalição, foi um prazo mais do que razoável. Apesar disso, faltando apenas uma semana para a “virada-chave”, ainda há muito a ser feito.

Portanto, respondendo à pergunta que nos propusemos no início desse episódio: Não. A Administração Pública não está preparada para a virada de chave da NLL. Houve um enorme despreparo e falta de organização do setor público durante os dois anos de transição.

Não à toa, estão surgindo diversas iniciativas normativas que, na prática, estendem a vigência da Lei n° 8.666/93 (tema que tratamos aqui). Nesse sentido, o Tribunal de Contas da União firmou recentíssimo entendimento de que até 31.12.2023 é permitido publicar editais de licitação regidos pela lei antigas, desde que a decisão por licitar por essa legislação antiga seja feita até 31.03.2023 (acessível aqui).

Analisando as últimas notícias sobre o tema, as iniciativas normativas de diversos entes federativos e o recente entendimento no TCU, tudo indica que a próxima semana será marcada por enorme pressão para que a Lei n° 8.666/93 continue em vigência por mais algum tempo.

Continuaremos atentos e retornaremos no dia 31/03 com o último episódio desta série.

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